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Oncologia

Câncer de Colo do Útero: Rastreamento, Tratamento e Perspectivas Futuras

6 Jan, 2025 | 10:00h

Introdução: O presente texto resume uma revisão abrangente acerca do câncer de colo do útero, abordando sua epidemiologia, fatores de risco, diagnóstico, estadiamento e tratamentos atuais. O objetivo principal é fornecer recomendações baseadas em evidências para a prevenção, detecção e manejo dessa neoplasia, considerando tanto estratégias de saúde pública quanto abordagens terapêuticas personalizadas.

Principais Recomendações:

  1. Prevenção e Rastreamento:
    • Vacinação contra HPV antes da exposição ao vírus, particularmente em adolescentes.
    • Rastreamento regular por meio de teste de Papanicolaou e/ou teste de HPV de alto risco, seguindo as diretrizes atuais.
    • Utilizar colposcopia e biópsias direcionadas quando houver alterações anormais nos exames de rastreamento.
  2. Abordagem de Doença Inicial (Estádios IA a IB2):
    • Histerectomia radical com linfadenectomia pélvica, com opção de preservação ovariana para possíveis benefícios hormonais.
    • Em casos específicos de tumores pequenos (menores que 2 cm) e margens livres, pode-se optar por cirurgia mais conservadora (histerectomia simples ou conização, conforme o caso).
    • Para pacientes que desejam manter fertilidade, considerar traquelectomia radical com cerclagem, associada à avaliação linfonodal (em situações bem selecionadas).
  3. Tratamento de Doença Localmente Avançada (Estádios IB3 a IVA):
    • Quimiorradioterapia combinada (radioterapia externa + braquiterapia) com cisplatina semanal como agente radiossensibilizante.
    • Avaliar incorporação de imunoterapia (pembrolizumabe) em estádios mais avançados (III a IVA), conforme orientações recentes.
    • Conservar intervalos de tratamento adequados (idealmente até 45 dias) para maximizar a eficácia do regime.
  4. Recorrência Central e Exenteração Pélvica:
    • Pacientes com recorrência central isolada podem se beneficiar de exenteração pélvica, após avaliação cuidadosa de metástases à distância.
    • O procedimento consiste na remoção en bloc dos órgãos pélvicos (útero, colo, bexiga e reto, em geral), com reconstruções específicas.
  5. Doença Metastática ou Recorrente (Primeira e Segunda Linhas):
    • Quimioterapia com cisplatina ou carboplatina em combinação com paclitaxel, associando bevacizumabe quando indicado.
    • Para tumores PD-L1–positivos, considerar adição de imunoterapia (por exemplo, pembrolizumabe).
    • Casos refratários podem ser tratados com anticorpos conjugados (por exemplo, tisotumab vedotin ou trastuzumabe deruxtecano, dependendo de biomarcadores).

Conclusão: A adoção de estratégias de vacinação, rastreamento adequado e acesso a tratamentos modernos pode reduzir substancialmente a incidência e a mortalidade por câncer de colo do útero. O manejo atual envolve tratamentos individualizados, considerando cirurgia, quimiorradioterapia, imunoterapia e novas terapias-alvo. A incorporação de diretrizes globais e a priorização de políticas públicas podem levar à erradicação dessa neoplasia como problema de saúde pública.

Referência:
Tewari KS. Cervical Cancer. New England Journal of Medicine. (2025); Link: https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMra2404457

 


Resultados Preliminares Sugerem Benefícios da Adição de Pembrolizumabe à Radioterapia e Cirurgia em Sarcomas de Extremidade em Estágio III

2 Jan, 2025 | 09:00h

Este estudo analisou pacientes com sarcomas de partes moles em estágio III, de alto ou intermediário grau (sarcoma pleomórfico indiferenciado ou lipossarcoma pleomórfico/dediferenciado) localizados nas extremidades ou na cintura de membros. Sabendo-se que cerca de metade dos pacientes pode desenvolver metástases, pesquisadores investigaram se a inclusão do pembrolizumabe ao tratamento padrão (radioterapia pré-operatória e cirurgia) traria melhora na sobrevida livre de doença.

O objetivo principal foi avaliar a sobrevida livre de doença em 143 pacientes recrutados em 20 centros acadêmicos na Austrália, Canadá, Itália e Estados Unidos. Os participantes foram divididos em dois grupos: grupo controle, recebendo apenas a radioterapia pré-operatória seguida de cirurgia; e grupo experimental, submetido à mesma radioterapia associada ao pembrolizumabe (antes, durante e após a irradiação), além de ciclos adjuvantes após a cirurgia.

O desenho do estudo foi randomizado e aberto, incluindo adultos e adolescentes a partir de 12 anos com tumores maiores que 5 cm, sem indicação de quimioterapia no protocolo. A terapia experimental combinou pembrolizumabe (200 mg a cada 3 semanas) à radioterapia de 50 Gy em 25 frações, seguida por cirurgia. O acompanhamento mediano foi de 43 meses.

Os resultados mostraram que o grupo que recebeu pembrolizumabe obteve maior sobrevida livre de doença em 2 anos (67% vs 52%). Porém, eventos adversos de grau 3 ou superior foram mais frequentes entre os que receberam a medicação (56% no grupo experimental versus 31% no grupo controle), reforçando a necessidade de avaliar cuidadosamente toxicidades e condições clínicas de cada paciente.

Assim, a associação de pembrolizumabe à radioterapia e cirurgia demonstrou resultados promissores para sarcomas localizados de alto risco, servindo como uma possível opção terapêutica para determinados casos. Contudo, a prudência se faz necessária em relação aos riscos de toxicidade e à falta de dados de seguimento mais longo, sobretudo quanto à sobrevida global.

Na prática clínica, o uso de imunoterapia pode representar uma alternativa ou complemento à quimioterapia convencional, principalmente levando em consideração o perfil de efeitos colaterais. Ainda assim, a indicação deve ser discutida caso a caso, considerando-se a escassez de dados robustos sobre efeitos a longo prazo e a heterogeneidade dos subtipos de sarcoma.

Entre os pontos fortes do estudo destacam-se a randomização, a avaliação bem definida da sobrevida livre de doença e a inclusão de diversos centros. Já como limitações, o tamanho reduzido da amostra (por se tratar de doença rara) e a impossibilidade de conclusões definitivas em subgrupos específicos, como os tipos histológicos menos representados, devem ser levados em conta.

Como perspectivas futuras, recomenda-se avaliar a associação de pembrolizumabe a diferentes estratégias (por exemplo, outros esquemas de dose de radioterapia ou combinada a quimioterápicos). Estudos maiores e com maior tempo de acompanhamento poderão confirmar, ou não, se as tendências observadas se traduzem em benefício duradouro para mais pacientes.

Referência
Mowery YM, Ballman KV, Hong AM, Schuetze SM, Wagner AJ, Monga V, et al. Safety and efficacy of pembrolizumab, radiation therapy, and surgery versus radiation therapy and surgery for stage III soft tissue sarcoma of the extremity (SU2C-SARC032): an open-label, randomised clinical trial. The Lancet. 2024;404(10467). DOI: http://doi.org/10.1016/S0140-6736(24)01812-9

 


Meta-análise: Um dia de dieta com baixo resíduo tem eficácia semelhante à de múltiplos dias na limpeza intestinal para colonoscopia

26 Dez, 2024 | 15:28h

Este estudo apresenta uma meta-análise que investigou se a adoção de um dia de dieta com baixo resíduo (DBR) é tão eficaz quanto seguir vários dias desse regime na preparação para colonoscopia. O contexto parte da necessidade de limpeza intestinal adequada, fundamental para a detecção e prevenção de patologias colorretais, incluindo pólipos e adenomas. Embora diretrizes recentes apoiem o uso de DBR, ainda não há consenso claro sobre a duração ideal (1 dia ou mais de 1 dia) para otimizar a preparação e melhorar a experiência do paciente.

O objetivo principal foi comparar a eficácia de 1 dia de DBR com mais de 1 dia de DBR em termos de qualidade da limpeza intestinal e de taxas de detecção de pólipos e adenomas. Para isso, foram incluídos seis estudos clínicos randomizados, com um total de 2.469 participantes adultos que se submeteram à colonoscopia por diferentes indicações clínicas. O desenho geral envolveu a prescrição de DBR por um ou vários dias, associada a diferentes soluções de preparo (por exemplo, polietilenoglicol com ou sem ascorbato, podendo incluir outras substâncias auxiliares). A comparação entre os grupos enfatizou taxas de preparo adequado, detecção de pólipos e adenomas, e tempos de retirada do colonoscópio.

Os resultados mostraram que a taxa de limpeza adequada, avaliada principalmente pelo Boston Bowel Preparation Scale (BBPS), foi semelhante entre o grupo de 1 dia de DBR (87,2%) e o grupo de múltiplos dias (87,1%). Não se observaram diferenças estatisticamente significativas na detecção de pólipos nem na de adenomas. Além disso, o tempo de retirada do colonoscópio e a taxa de intubação cecal mostraram resultados equiparáveis entre as duas estratégias de dieta.

Em termos de conclusões, o estudo reforça que um período mais curto de DBR (apenas 1 dia) pode ser suficientemente eficaz para garantir visualização adequada do cólon, sem comprometer as taxas de detecção de lesões importantes. Assim, a adoção de 1 dia de DBR surge como uma alternativa prática e segura, podendo facilitar a adesão dos pacientes, reduzir a carga alimentar restritiva e otimizar o fluxo de procedimentos nos serviços de endoscopia.

Nas implicações para a prática clínica, ressalta-se que o menor tempo de restrição pode aumentar o conforto e a cooperação do paciente, sem queda na qualidade da limpeza. Contudo, a decisão final deve considerar condições específicas, como constipação crônica e comorbidades, além das preferências individuais.

Entre os pontos fortes do estudo, destaca-se a inclusão exclusiva de ensaios clínicos randomizados, o que reforça a confiabilidade dos achados. A heterogeneidade foi baixa ou ausente nos principais desfechos, indicando boa consistência metodológica. Como limitações, houve variação nos protocolos de DBR (inclusive quanto aos cardápios adotados) e diferenças quanto a desfechos secundários avaliados. Ademais, alguns estudos apresentaram risco de viés por seleção ou métodos de análise.

Para pesquisas futuras, sugere-se ampliar a investigação de desfechos econômicos (custos com preparo), adesão dos pacientes (satisfação, conforto) e possíveis diferenças em grupos específicos (por exemplo, pessoas idosas ou constipadas). Investigações adicionais sobre a composição exata da DBR em diferentes contextos culturais podem auxiliar na elaboração de diretrizes mais detalhadas.

Referência
Putri RD, Amalia F, Utami FA, Pamela Y, Syamsunarno MRAA. One-day low-residue diet is equally effective as the multiple-day low-residue diet in achieving adequate bowel cleansing: a meta-analysis of randomized controlled trials. Clinical Endoscopy. 2024. DOI: https://doi.org/10.5946/ce.2024.061

 


Estudo Randomizado: Daratumumabe reduz a progressão para mieloma múltiplo em pacientes com mieloma múltiplo indolente de alto risco

26 Dez, 2024 | 12:56h

Esse estudo surgiu diante da necessidade de encontrar uma opção terapêutica que pudesse retardar ou impedir o avanço do mieloma indolente de alto risco – uma condição em que os pacientes ainda não apresentam sintomas, mas exibem características laboratoriais que os predispõem a desenvolver mieloma múltiplo ativo em curto prazo. O objetivo central da pesquisa foi avaliar se a monoterapia subcutânea com daratumumabe prolongaria o tempo até a progressão da doença ou morte, em comparação à vigilância ativa, considerada padrão de cuidado atual para esses casos.

Para tanto, foi conduzido um ensaio clínico de fase 3 (AQUILA) envolvendo 390 participantes com mieloma múltiplo indolente de alto risco. Eles foram aleatoriamente designados para receber daratumumabe ou apenas acompanhamento sem intervenção específica. O tratamento (daratumumabe) foi programado para até 36 meses, totalizando 39 ciclos, ou até a confirmação de progressão para mieloma ativo. Os resultados demonstraram que o grupo tratado com daratumumabe apresentou redução significativa do risco de progressão para mieloma múltiplo ativo ou morte, em comparação ao grupo em monitoramento (hazard ratio de 0,49). Em cinco anos, a sobrevida livre de progressão foi de 63,1% no grupo daratumumabe, contra 40,8% no grupo monitorado ativamente, indicando clara vantagem em retardar o surgimento de lesões orgânicas que caracterizam o mieloma sintomático. Além disso, apenas 7,7% dos pacientes no braço daratumumabe vieram a óbito, em comparação a 13,3% no grupo de vigilância. A sobrevida global em cinco anos foi de 93,0% e 86,9%, respectivamente. Em termos de segurança, o efeito adverso de grau 3 ou 4 mais observado foi hipertensão, mas em proporções bastante semelhantes entre os grupos (5,7% vs. 4,6%), sem evidência de novos problemas de toxicidade.

Os achados sugerem que iniciar daratumumabe precocemente pode interferir de modo benéfico na história natural do mieloma múltiplo indolente de alto risco, possivelmente impedindo ou adiando complicações graves. Em relação à prática clínica, esses resultados podem estimular a adoção de um regime de tratamento antecipado para pacientes com alto risco de progressão, embora ainda sejam necessárias cautela e avaliação criteriosa das características individuais de cada paciente.

Entre os pontos fortes do estudo está o longo acompanhamento, que reforça a validade dos dados de eficácia e segurança. Já as limitações incluem a sub-representação de algumas populações e o fato de as definições de mieloma indolente de alto risco terem evoluído ao longo do tempo, podendo afetar as comparações com critérios mais recentes.

Futuras pesquisas podem investigar esquemas combinados com daratumumabe ou avaliar o uso de regimes menos intensivos, a fim de balancear eficácia e possíveis efeitos adversos a longo prazo. Também são relevantes estudos que confirmem a utilidade de estratégias de rastreamento para detecção precoce do mieloma indolente.

Referência
Dimopoulos MA, Voorhees PM, Schjesvold F, Cohen YC, Hungria V, Sandhu I, Lindsay J, +29, for the AQUILA Investigators. Daratumumab or Active Monitoring for High-Risk Smoldering Multiple Myeloma. New England Journal of Medicine. Publicado em 9 de dezembro de 2024. DOI: http://doi.org/10.1056/NEJMoa2409029

 


Estudo Randomizado: Omissão de Drenagem Profilática após Gastrectomia Aumenta a Necessidade de Procedimentos Invasivos Pós-Operatórios

25 Dez, 2024 | 09:54h

Este estudo investigou se a omissão de drenagem profilática após gastrectomia por câncer poderia manter a mesma segurança em relação à necessidade de reoperações ou drenagens adicionais. Esse é um tema relevante, pois a literatura mais antiga e protocolos de recuperação acelerada (ERAS) questionam o uso rotineiro de drenos, embora muitos serviços ainda os utilizem para prevenir ou identificar complicações intra-abdominais.

A pesquisa foi conduzida em 11 centros na Itália, incluindo hospitais universitários e comunitários, envolvendo 390 pacientes com indicação de gastrectomia subtotal ou total por neoplasia gástrica. Eles foram randomizados para receber ou não um dreno no final da cirurgia, com acompanhamento de 30 e 90 dias. O desfecho primário foi a necessidade de reoperação ou drenagem percutânea até 30 dias após o procedimento cirúrgico. A hipótese inicial era de não inferioridade ao omitir o dreno, considerando uma margem pré-estabelecida.

Os resultados mostraram que 15 pacientes (7,7%) no grupo com dreno e 29 (15%) no grupo sem dreno necessitaram de reoperação ou drenagem percutânea em até 30 dias, evidenciando maior risco de procedimentos invasivos na ausência de dreno. Esse aumento esteve relacionado, principalmente, a reoperações, pois a necessidade de drenagem percutânea foi semelhante em ambos os grupos. As complicações associadas ao uso do dreno foram pouco frequentes (2%). Não houve diferença significativa na incidência total de complicações cirúrgicas ou na taxa de fístulas anastomóticas e duodenais, porém o grupo sem dreno apresentou mais reoperações e maior mortalidade hospitalar. A duração de internação e as taxas de reinternação foram semelhantes entre os grupos.

O estudo concluiu que a prática de não colocar dreno profilático pode elevar o risco de intervenções invasivas no pós-operatório, especialmente quando se considera a realidade de hospitais com menor volume ou infraestrutura limitada. Embora diretrizes anteriores, como as do ERAS, desestimulem o uso rotineiro de drenagem, estes achados reforçam a necessidade de reavaliar tais recomendações em gastrectomias, sobretudo em casos de gastrectomia total, que apresentam anastomoses mais complexas.

Na prática clínica, esses resultados chamam a atenção para individualizar a decisão sobre o dreno, levando em conta o perfil de risco do paciente, a experiência da equipe cirúrgica e a disponibilidade de suporte hospitalar. O dreno não reduziu o tempo de internação nem o número total de complicações, mas proporcionou detecção mais precoce de algumas situações e, principalmente, evitou reoperações em determinados cenários.

Entre os pontos fortes, destaca-se o delineamento multicêntrico com número robusto de participantes e adoção de definições padronizadas para complicações. Entre as limitações, cita-se a ausência de investigação sobre níveis de amilase no dreno e a impossibilidade de “cegamento” absoluto após a cirurgia, o que pode interferir em algumas decisões pós-operatórias. Pesquisas futuras podem focalizar subgrupos de maior risco, a exemplo de gastrectomias totais ou de casos com neoadjuvância mais agressiva, para verificar se há perfil de pacientes que mais se beneficiam do dreno profilático.

Referência
Weindelmayer J, Mengardo V, Ascari F, et al. Prophylactic Drain Placement and Postoperative Invasive Procedures After Gastrectomy: The Abdominal Drain After Gastrectomy (ADIGE) Randomized Clinical Trial. JAMA Surg. Publicado online em 27 de novembro de 2024. DOI: http://doi.org/10.1001/jamasurg.2024.5227

Comentário Editorial
Coffey MR, Lambert KE, Strong VE. Refrain From the Drain? The ADIGE Trial Brings Gastrectomy to the Debate. JAMA Surg. Publicado online em 27 de novembro de 2024. DOI: http://doi.org/10.1001/jamasurg.2024.5228

 


Atualização da AGA sobre Triagem e Vigilância em Indivíduos com Maior Risco de Câncer Gástrico nos EUA: Revisão de Especialistas

25 Dez, 2024 | 08:05h

Introdução: O presente documento, publicado pela American Gastroenterological Association (AGA), aborda estratégias de prevenção primária e secundária do câncer gástrico (CG) em populações de alto risco nos Estados Unidos. Apesar de a incidência geral do CG ter diminuído em algumas regiões, certos grupos raciais, étnicos e imigrantes de primeira geração provenientes de áreas com alta prevalência de CG permanecem vulneráveis. O objetivo principal desta revisão é fornecer orientações de melhores práticas para triagem endoscópica, vigilância de lesões pré-malignas e rastreamento de Helicobacter pylori, de forma a reduzir a morbidade e mortalidade relacionadas ao CG.

Principais Recomendações:

  1. Populações de alto risco: Incluem imigrantes de primeira geração de áreas com alta incidência de CG, indivíduos com histórico familiar de CG em parentes de primeiro grau e aqueles com síndromes hereditárias associadas ao câncer gastrointestinal.
  2. Método de triagem preferencial: A endoscopia digestiva alta (EDA) é o exame recomendado para rastrear e vigiar condições pré-malignas (atrofia gástrica e metaplasia intestinal) e neoplasias gástricas iniciais, permitindo biópsias e estadiamento tecidual.
  3. Qualidade do exame endoscópico: O uso de equipamentos de alta definição, limpeza adequada da mucosa gástrica, tempo suficiente de inspeção e realização de biópsias sistemáticas (por exemplo, protocolo de Sydney ampliado) são fatores críticos para melhor detecção de lesões.
  4. Erradicação do H. pylori: Além da triagem endoscópica, a erradicação do H. pylori constitui estratégia fundamental de prevenção primária (reduzindo a incidência) e secundária (evitando evolução de lesões pré-malignas).
  5. Obtenção de biópsias sistemáticas: Em casos de suspeita de atrofia ou metaplasia, devem ser colhidas pelo menos cinco biópsias do antro/incisura e do corpo gástrico em frascos separados, mais amostras adicionais de áreas suspeitas.
  6. Capacitação na detecção de metaplasia e displasia: A familiaridade do endoscopista com a aparência endoscópica da metaplasia intestinal e da displasia é essencial; em muitos casos, o treinamento específico e o uso de tecnologias de imagem (por exemplo, narrow band imaging) aumentam a acurácia diagnóstica.
  7. Estratificação de risco e vigilância: A decisão sobre intervalos de vigilância endoscópica (por exemplo, a cada 3 anos) deve levar em conta a gravidade e extensão da atrofia/metaplasia, presença de displasia e fatores adicionais (história familiar, tabagismo, entre outros).
  8. Manejo da displasia: Toda displasia deve ser confirmada por patologista gastrointestinal experiente. Lesões suspeitas ou confirmadas (p. ex., displasia de alto grau ou câncer gástrico precoce) devem ser encaminhadas para centros com expertise em ressecção endoscópica (dissecção endoscópica submucosa).
  9. Rastreamento de familiares: A triagem para H. pylori em contactantes próximos de indivíduos infectados pode aumentar as taxas de erradicação familiar e diminuir a recidiva.
  10. Descontinuação de rastreamento: A triagem e a vigilância devem ser interrompidas em pacientes sem condições clínicas de se submeterem a procedimentos endoscópicos ou cirúrgicos curativos.
  11. Equidade na saúde e abordagens personalizadas: Para reduzir disparidades, a avaliação de risco deve considerar fatores como raça, etnia, local de origem, condições socioeconômicas e acesso à saúde, visando um cuidado sob medida para cada indivíduo.

Conclusão: A implementação de um programa efetivo de rastreamento e vigilância do CG nos Estados Unidos depende de três pilares: identificação adequada dos indivíduos de risco (incluindo erradicação do H. pylori), realização de endoscopias de alta qualidade e seguimento apropriado dos achados, com intervalos de vigilância personalizados. A abordagem multifatorial, incluindo políticas de saúde que favoreçam o acesso ao diagnóstico precoce, pode impactar significativamente a mortalidade por CG, promovendo equidade e melhores desfechos clínicos.

Referência:
Shah SC, Wang AY, Wallace MB, Hwang JH. AGA Clinical Practice Update on Screening and Surveillance in Individuals at Increased Risk for Gastric Cancer in the United States: Expert Review. Gastroenterology. Publicado online em 23 de dezembro de 2024.
Link DOI: https://doi.org/10.1053/j.gastro.2024.11.001

 


Comparação de regimes de quimioterapia de primeira linha em câncer pancreático localmente avançado ou metastático irressecável: revisão sistemática e meta-análise em rede Bayesiana

22 Dez, 2024 | 14:39h

Contexto: O adenocarcinoma ductal de pâncreas (PDAC) permanece altamente letal, com cerca de 80% dos casos diagnosticados em estágio localmente avançado ou metastático. Desde o uso de gemcitabina isolada em 1997 como padrão de cuidado, houve aprovação de novas combinações (p. ex., FOLFIRINOX e gemcitabina mais nab-paclitaxel), mas comparações diretas entre esses esquemas ainda são escassas. Recentemente, o regime NALIRIFOX obteve resultados positivos em comparação com gemcitabina mais nab-paclitaxel. Entretanto, não há consenso claro sobre qual combinação deve ser preferida.

Objetivo: Avaliar e comparar, por meio de revisão sistemática e meta-análise em rede, a eficácia e a segurança dos principais regimes quimioterápicos de primeira linha para PDAC localmente avançado ou metastático, fornecendo uma hierarquia baseada em sobrevida livre de progressão (SLP), sobrevida global (SG) e toxicidade.

Métodos: As bases PubMed, Cochrane Central, Embase e sites de congressos oncológicos foram pesquisados até 15 de novembro de 2023. Foram incluídos ensaios clínicos randomizados de fase 2–3, publicados a partir de 2000, em pacientes sem tratamento prévio para PDAC irressecável. Os desfechos principais foram SLP e SG; dados de resposta objetiva e eventos adversos grau 3–4 também foram analisados. As análises foram conduzidas em modelo Bayesiano, comparando hazard ratios (HRs) ou odds ratios (ORs) e ordens de classificação (SUCRA). O risco de viés foi avaliado pela ferramenta RoB 2 e a qualidade da evidência pelo GRADE.

Resultados: Um total de 79 ensaios (22.168 pacientes) foi incluído. Em comparação à gemcitabina isolada, os regimes com maior benefício em SLP foram gemcitabina mais nab-paclitaxel em alternância com FOLFOX (HR 0,32), PAXG (0,35) e NALIRIFOX (0,43), seguidos por FOLFIRINOX (0,55) e gemcitabina mais nab-paclitaxel (0,62). Achados semelhantes foram observados para SG, com PAXG (HR 0,40), gemcitabina mais nab-paclitaxel alternado com FOLFOX (0,46) e NALIRIFOX (0,56) no topo da classificação. Entre os regimes triplet, NALIRIFOX apresentou perfil de menor toxicidade hematológica, enquanto FOLFIRINOX e combinações com nab-paclitaxel tiveram maior incidência de neuropatia e diarreia. A maioria dos estudos foi classificada como baixo risco ou risco de viés moderado, e a certeza geral da evidência foi considerada baixa.

Conclusões: Os resultados reforçam que triplet ou quadruplet (p. ex., NALIRIFOX ou FOLFIRINOX) podem ser opções preferenciais para pacientes que tolerem regimes mais intensivos, enquanto gemcitabina mais nab-paclitaxel permanece como alternativa importante para aqueles com pior estado geral. Estudos fase 3 adicionais, especialmente sobre regimes quádruplos ou estratégias sequenciais, são necessários.

Implicações para a Prática: A escolha do regime deve levar em conta o perfil de toxicidade, custo-benefício e características individuais do paciente. Pacientes aptos a esquemas intensivos podem se beneficiar de triplet ou quadruplet, ao passo que os demais podem receber gemcitabina mais nab-paclitaxel. O acompanhamento cuidadoso de efeitos adversos e a atenção à qualidade de vida são cruciais, dada a sobrevida ainda limitada nessa população.

Pontos Fortes e Limitações do Estudo: Pontos fortes incluem a abrangência da busca, com 79 ensaios e 22.168 pacientes, além do uso de múltiplas análises de sensibilidade. Entre as limitações estão a heterogeneidade dos estudos (fases 2 e 3, diferentes populações), ausência de dados individuais e variações nos critérios de avaliação de resposta e toxicidade. A maioria dos ensaios não realizou revisão central independente das imagens.

Pesquisas Futuras: São necessárias comparações diretas em fase 3 envolvendo NALIRIFOX, FOLFIRINOX, gemcitabina mais nab-paclitaxel e regimes quádruplos. Outras áreas de investigação incluem a identificação de biomarcadores de resposta e estratégias de quimioterapia sequencial, bem como a adoção precoce de cuidados paliativos.

Referência: Mastrantoni L, Chiaravalli M, Spring A, et al. Comparison of first-line chemotherapy regimens in unresectable locally advanced or metastatic pancreatic cancer: a systematic review and Bayesian network meta-analysis. The Lancet Oncology. 2024;25(12). DOI: http://doi.org/10.1016/S1470-2045(24)00511-4

 


Ensaio Randomizado de Não-Inferioridade: Omissão da Cirurgia Axilar Mantém Mesma Sobrevida Livre de Doença Invasiva em 5 Anos no Câncer de Mama Estágio Inicial

13 Dez, 2024 | 12:13h

Contexto: A necessidade de estadiamento axilar cirúrgico (biópsia de linfonodo sentinela) no tratamento conservador da mama em pacientes com câncer de mama invasivo inicial e linfonodos clinicamente negativos (cN0) tem sido questionada. Com a crescente ênfase nas características biológicas do tumor, o papel prognóstico do status linfonodal diminuiu, e intervenções mais conservadoras podem ser consideradas, desde que não comprometam a sobrevida.

Objetivo: Avaliar se a omissão da cirurgia axilar (sem biópsia de linfonodo sentinela) é não-inferior em termos de sobrevida livre de doença invasiva em 5 anos, em comparação à realização da biópsia de linfonodo sentinela, em pacientes com câncer de mama T1 ou T2 (≤5 cm) clinicamente linfonodo-negativo submetidas a cirurgia conservadora.

Métodos: Este ensaio clínico prospectivo, randomizado e de não-inferioridade incluiu 5502 pacientes com câncer de mama invasivo cN0, T1 ou T2, candidatas à cirurgia conservadora da mama. As pacientes foram randomizadas (1:4) para omissão da cirurgia axilar (sem biópsia de linfonodo sentinela) versus biópsia de linfonodo sentinela. A análise per protocolo incluiu 4858 pacientes. Todas receberam radioterapia adjuvante do tipo padrão, sem alvo específico na axila. A sobrevida livre de doença invasiva, definida como tempo até recidiva invasiva local, axilar ou à distância, novo câncer invasivo contralateral, segundo tumor invasivo primário não mamário ou morte por qualquer causa, foi o desfecho primário.

Resultados: Após seguimento mediano de 73,6 meses, a taxa de sobrevida livre de doença invasiva em 5 anos foi 91,9% (IC95%: 89,9–93,5) no grupo sem cirurgia axilar e 91,7% (IC95%: 90,8–92,6) no grupo submetido à biópsia de linfonodo sentinela (HR=0,91; IC95%: 0,73–1,14), confirmando a não-inferioridade. Houve ligeiro aumento da recidiva axilar no grupo sem cirurgia (1,0% vs. 0,3%), mas sem impacto negativo na sobrevida. A incidência de linfedema, restrição de mobilidade e dor no braço ou ombro foi menor no grupo sem cirurgia axilar.

Conclusões: Em pacientes selecionadas com câncer de mama cN0, T1 ou T2, a omissão da cirurgia axilar foi não-inferior à biópsia de linfonodo sentinela em termos de sobrevida livre de doença invasiva em 5 anos, sem comprometer a eficácia oncológica e reduzindo complicações relacionadas à cirurgia axilar.

Implicações para a Prática: A omissão da biópsia de linfonodo sentinela pode ser considerada em pacientes com perfis de baixo risco, especialmente mulheres mais velhas com tumores luminais pequenos, potencialmente reduzindo complicações e melhorando a qualidade de vida sem comprometer o controle da doença. No entanto, a ausência de informação linfonodal pode impactar a tomada de decisão quanto à radioterapia e ao tratamento sistêmico, exigindo ponderação individualizada.

Forças e Limitações do Estudo: Forças incluem grande amostra, desenho prospectivo, randomizado e acompanhamento mediano de 6 anos. As limitações incluem a baixa proporção de tumores maiores (T2) e de subtipos biológicos mais agressivos, além da possibilidade de impacto nas decisões terapêuticas adjuvantes devido à falta de informações do status linfonodal.

Pesquisas Futuras: Estudos adicionais devem investigar a aplicabilidade desta omissão em subgrupos mais amplos, incluindo pacientes mais jovens, tumores maiores ou subtipos biológicos mais agressivos, além de avaliar estratégias adjuvantes que compensariam a ausência do estadiamento axilar cirúrgico.

Referência: Reimer T, Stachs A, Veselinovic K, Kühn T, Heil J, Polata S, Marmé F, et al. Axillary Surgery in Breast Cancer — Primary Results of the INSEMA Trial. New England Journal of Medicine. 2024. DOI: http://doi.org/10.1056/NEJMoa2412063

 


Revisão sistemática | Hidratação assistida em cuidados paliativos: efeitos incertos na qualidade de vida e sobrevida

27 Jun, 2023 | 12:04h

Resumo: Esta revisão da Cochrane analisou ensaios clínicos randomizados (ECR) para avaliar o impacto da hidratação medicamente assistida (HMA) na qualidade de vida (QdV) e sobrevida de adultos recebendo cuidados paliativos. Foram considerados 4 estudos envolvendo 422 participantes, todos diagnosticados com câncer avançado. Dois estudos compararam a HMA com placebo, e dois a compararam com cuidados padrão.

O desfecho primário foi QdV, avaliada por escalas validadas, sendo a sobrevida e eventos adversos os desfechos secundários. Foram calculadas as diferenças médias (DM) e as razões de risco (RR) para os resultados contínuos e dicotômicos, respectivamente. No entanto, os resultados foram inconclusivos em virtude da muito baixa certeza das evidências. Portanto, não está claro se a HMA melhora a QdV, prolonga a sobrevida ou leva a eventos adversos quando comparada ao placebo ou aos cuidados padrão.

Os achados são aplicáveis apenas a pacientes internados com câncer avançado no final da vida e não se aplicam a outros adultos em cuidados paliativos com doenças não cancerígenas, demência ou doenças neurodegenerativas. A falta de evidências de alta qualidade deixa aos clínicos a decisão com base nos benefícios e danos percebidos para as circunstâncias individuais.

Artigo: Medically assisted hydration for adults receiving palliative care – Cochrane Library

 


Estudo de coorte | Sobreviventes jovens de AVC apresentam maior risco de câncer por até 8 anos

4 Abr, 2023 | 12:35h

Resumo: Neste estudo de coorte, foram analisados 390.398 pacientes com 15 anos ou mais nos Países Baixos, sem histórico de câncer e com um primeiro acidente vascular cerebral (AVC) isquêmico (AVCI) ou hemorrágico (AVCH) entre 1º de janeiro de 1998 e 1º de janeiro de 2019. O desfecho primário foi a incidência cumulativa de primeiro câncer após o AVC índice, estratificado por subtipo de AVC, idade e sexo, comparado com indivíduos pareados por idade, sexo e ano do calendário da população geral.

Os resultados mostraram que, no primeiro ano após um AVC, pacientes com idades entre 15 e 49 anos apresentaram um risco 3 a 5 vezes maior de câncer em comparação com indivíduos sem AVC. Em contraste, o risco foi apenas ligeiramente elevado para pacientes com 50 anos ou mais. O risco de câncer permaneceu elevado por até 8 anos após um AVCI e 6 anos após uma AVCH no grupo etário mais jovem, com os maiores riscos observados para câncer de pulmão, câncer gastrointestinal e câncer hematológico.

Os resultados podem ser explicados por fatores de risco compartilhados, como o tabagismo. Outra opção é que o aumento do risco de câncer pode ter um mecanismo causal entre câncer e AVC, possivelmente relacionado ao estado de hipercoagulação induzido pelo câncer. No entanto, o desenho do estudo não permite conclusões sobre mecanismos causais, e os pesquisadores sugerem mais estudos investigando a utilidade de rastreamento de câncer após um AVC.

Artigo: Association of Stroke at Young Age With New Cancer in the Years After Stroke Among Patients in the Netherlands – JAMA Network Open (link para o Google Tradutor)

 


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