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Revisões Sistemáticas

Medicações Glutamatérgicas Mostram Potencial no Tratamento de Transtornos Obsessivo-Compulsivos e Correlatos

4 Jan, 2025 | 09:45h

Este estudo conduzido por Coelho e colaboradores avaliou o papel dos fármacos glutamatérgicos no manejo de Transtornos Obsessivo-Compulsivos e Correlatos (OCRDs), um espectro de condições neuropsiquiátricas que inclui o Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC), o transtorno dismórfico corporal, o transtorno de escoriação (skin picking), a tricotilomania e o transtorno de acumulação. Esses transtornos podem comprometer seriamente a qualidade de vida, atingindo cerca de 2% a 3% da população.

O principal objetivo foi investigar se o uso desses fármacos, isolados ou em associação com inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRSs), poderia reduzir a sintomatologia de OCRDs em comparação ao placebo, analisando preferencialmente ensaios clínicos randomizados, duplo-cegos e controlados por placebo.

O desenho incluiu 27 estudos, totalizando 1369 indivíduos de diferentes faixas etárias e gêneros, todos com diagnóstico de algum OCRD, incluindo TOC. Variadas substâncias glutamatérgicas foram examinadas — como N-acetilcisteína (NAC), memantina, lamotrigina, riluzol e topiramato— comparadas ao placebo, tanto em monoterapia quanto em combinação a ISRSs. Dados de melhora clínica foram obtidos por escalas padronizadas (por exemplo, a Yale-Brown Obsessive Compulsive Scale (Y-BOCS), no caso do TOC) e sintetizados usando meta-análises de efeitos randômicos. Foram realizadas análises de subgrupos considerando o tipo de OCRD, população, refratariedade, estratégia de combinação, risco de viés e tipo de fármaco glutamatérgico.

Entre os principais resultados, observou-se que os fármacos glutamatérgicos estiveram associados a uma redução significativa nos sintomas de OCRDs em geral, com um efeito de grande magnitude (Cohen’s d = -0,80). Focando no TOC (n=23 estudos), houve redução média de 4,17 pontos nos escores da Y-BOCS, sugerindo benefício clínico. Apesar disso, a heterogeneidade elevada entre os estudos, possivelmente devido à diversidade de populações e desenhos de tratamento, e a possibilidade de viés de publicação demandam cautela na interpretação.

As conclusões apontam para o potencial promissor desses fármacos no tratamento de OCRDs, particularmente para pacientes com TOC. No entanto, a alta heterogeneidade e a possibilidade de viés de publicação exigem uma interpretação cautelosa dos resultados. A aplicação prática pode envolver avaliação individualizada de cada caso, considerando a possibilidade de complementar ou substituir tratamentos tradicionais, sempre com cuidado para potenciais efeitos adversos e com monitoramento próximo.

Do ponto de vista de implicações clínicas, a sobriedade no uso de medicações glutamatérgicas é recomendada, pois embora o estudo aponte benefícios, nem todos os pacientes podem se beneficiar igualmente. Novos protocolos de tratamento devem ser orientados por avaliações criteriosas de risco-benefício.

Pontos fortes do trabalho incluem a análise sistemática de vários subtipos de OCRDs e a adoção de escalas bem validadas, além de um desenho metodológico robusto na maior parte dos estudos. Entretanto, as limitações englobam o número reduzido de ensaios sobre alguns subtipos menos frequentes (como transtorno dismórfico corporal e de acumulação), a diversidade de populações e estratégias terapêuticas, o que pode comprometer a comparabilidade, e o fato de poucos estudos terem testado fármacos mais novos, como a cetamina.

Pesquisas futuras, com amostras maiores e metodologias mais robustas, são necessárias para confirmar esses achados, determinar a dosagem ideal, elucidar quais subgrupos de pacientes se beneficiam mais, testar doses e durações diferentes, avaliar subtipos de OCRDs menos estudados e possíveis novos fármacos glutamatérgicos ainda não incluídos nesta meta-análise.

Referência: Coelho DRA, Yang C, Suriaga A, et al. Glutamatergic Medications for Obsessive-Compulsive and Related Disorders: A Systematic Review and Meta-Analysis. JAMA Netw Open. 2025;8(1):e2452963. DOI: http://doi.org/10.1001/jamanetworkopen.2024.52963


Anticoagulação em Pacientes Hospitalizados com COVID-19: Dose Terapêutica Reduz Mortalidade em 28 Dias

6 Jan, 2025 | 12:00h

Este amplo estudo multicêntrico avaliou a eficácia e a segurança de doses mais elevadas de anticoagulantes (principalmente heparinas) em comparação a doses mais baixas em pacientes hospitalizados por COVID-19. A motivação inicial veio da observação de altas taxas de trombose nessa população, associadas a quadros inflamatórios intensos. Assim, o objetivo principal foi comparar o efeito de diferentes doses de anticoagulantes (terapêutica, intermediária ou profilática) na mortalidade em 28 dias.

No total, foram incluídos 22 ensaios clínicos randomizados (principalmente com heparinas de baixo peso molecular ou heparina não fracionada), abrangendo mais de 11 mil pacientes. A maior parte comparou dose terapêutica versus dose profilática, enquanto alguns estudos adicionaram o braço intermediário. A avaliação metodológica foi feita com base no protocolo pré-registrado, e os resultados foram analisados de forma prospectiva, com dados detalhados fornecidos pelos próprios pesquisadores.

Os resultados indicaram que a anticoagulação em dose terapêutica, comparada à dose profilática, reduziu a mortalidade em 28 dias (OR 0.77; IC 95%, 0.64-0.93) em pacientes que, em sua maioria, recebiam pouco ou nenhum suporte de oxigênio no momento da randomização. Na comparação entre doses terapêuticas e intermediárias, observou-se um aumento não estatisticamente significativo na mortalidade no grupo da dose terapêutica (OR 1.21; IC 95% 0.93-1.58). Já a dose intermediária, quando comparada à profilática, não apresentou diferença significativa na mortalidade (OR 0.95; IC 95% 0.76-1.19). Em todas as comparações, observou-se que a dose mais elevada reduzia eventos tromboembólicos (por exemplo, OR 0.48 na comparação entre dose terapêutica e profilática), porém aumentava o risco de sangramentos maiores (OR 1.90 na mesma comparação). A influência do nível de suporte ventilatório (nenhum/baixo fluxo vs. suporte avançado) não se mostrou robusta para alterar substancialmente os achados, embora algumas análises tenham sido limitadas pelo número de pacientes em cada subgrupo.

Do ponto de vista clínico, a conclusão geral sugere possível benefício da anticoagulação em dose terapêutica para pacientes hospitalizados com COVID-19 que não estejam em ventilação mecânica invasiva ou em estados mais críticos de suporte respiratório. Contudo, a decisão deve ser ponderada pelo maior risco de sangramento. Segundo comentário editorial publicado na mesma revista (DOI: https://doi.org/10.7326/ANNALS-24-03244), ainda existem incertezas sobre a real aplicabilidade desses achados nos estágios mais atuais da pandemia, devido a mudanças nas variantes do vírus e ao surgimento de novas formas de tratamento.

Implicações para a Prática

Os resultados apoiam a adoção mais criteriosa de doses terapêuticas em pacientes não críticos, atentando ao risco de sangramento e ao perfil de gravidade. Para casos que envolvem ventilação mecânica invasiva ou estado crítico, não houve evidência robusta de benefício com doses terapêuticas em relação às intermediárias ou profiláticas.

Pontos Fortes e Limitações

Entre os pontos fortes, destacam-se a análise prospectiva e a inclusão de diversos ensaios, cobrindo diferentes cenários de COVID-19. Como limitação, as comparações envolveram populações com graus distintos de gravidade e, embora tenha havido uma padronização razoável, houve alguma variação nas doses utilizadas nos grupos controle. Além disso, a evolução da pandemia e o surgimento de novas variantes podem reduzir a validade externa para o momento atual.

Pesquisas Futuras

Investigações adicionais são necessárias para delimitar com mais precisão quais subgrupos (por exemplo, níveis de D-dímero, comorbidades ou perfis inflamatórios) podem se beneficiar mais da dose terapêutica, e qual o melhor momento de iniciar ou descontinuar o tratamento.

Referência: The WHO Rapid Evidence Appraisal for COVID-19 Therapies (REACT) Working Group. Anticoagulation Among Patients Hospitalized for COVID-19: A Systematic Review and Prospective Meta-analysis. Annals of Internal Medicine. DOI: https://doi.org/10.7326/ANNALS-24-00800

Editorial: Shappell CN, Anesi GL. Anticoagulation for COVID-19: Seeking Clarity and Finding Yet More Gray. Annals of Internal Medicine. DOI: https://doi.org/10.7326/ANNALS-24-03244


Meta-análise: Inibidores de fosfodiesterase de meia-vida longa podem reduzir os níveis de HbA1c em pacientes com diabetes

1 Jan, 2025 | 16:45h

Os inibidores de fosfodiesterase 5 (PDE5) são amplamente conhecidos pelo seu uso no tratamento de disfunção erétil e hipertensão pulmonar, mas vêm ganhando atenção como potencial terapia combinada para indivíduos com diabetes tipo 2. O estudo em questão avaliou se existe diferença no impacto sobre o controle glicêmico (medido pelo HbA1c) entre inibidores de PDE5 de meia-vida longa (como tadalafil e PF-00489791) e de meia-vida curta (como sildenafil e avanafil).

A pesquisa surge em um cenário de crescente prevalência de diabetes no mundo, em que a busca por novas estratégias terapêuticas — inclusive reuso de medicamentos já aprovados — tem sido uma prioridade para aprimorar o controle metabólico. Nesse contexto, o objetivo central foi comparar o efeito dessas diferentes medicações sobre o HbA1c, que reflete a glicemia média dos últimos três meses e se correlaciona a complicações microvasculares e cardiovasculares.

Para isso, os autores realizaram uma revisão sistemática e meta-análise de ensaios clínicos randomizados que envolveram pacientes com HbA1c ≥ 6%. Foram incluídos somente estudos com duração mínima de quatro semanas de intervenção contínua com inibidores de PDE5, comparados a um grupo controle ou placebo. No total, 13 estudos preencheram esses critérios, avaliando tanto inibidores de meia-vida curta quanto de meia-vida longa.

Nos resultados, identificou-se que, de modo geral, os inibidores de PDE5 de meia-vida longa se associaram a reduções estatisticamente significativas nos níveis de HbA1c em comparação ao controle. Em sete estudos analisados, o grupo que recebeu tadalafil ou PF-00489791 apresentou redução média de cerca de −0,40% no HbA1c, efeito comparável aos obtidos por outros antidiabéticos em populações com níveis de HbA1c já razoavelmente controlados (entre 7% e 8%). Por outro lado, os inibidores de meia-vida curta (sildenafil e avanafil) não mostraram diminuição consistente no HbA1c, havendo até um leve aumento em subanálises de estudos mais longos (≥8 semanas) realizados exclusivamente com portadores de diabetes tipo 2 e HbA1c ≥ 6,5%.

Como conclusão, esses achados indicam que, na prática clínica, PDE5 de meia-vida longa parecem oferecer vantagem adicional para o controle glicêmico em comparação aos de meia-vida curta, possivelmente pela maior estabilidade farmacológica e adesão do paciente. Embora os resultados gerais sejam promissores, é preciso cautela na interpretação, visto que muitos estudos incluídos envolveram indivíduos com HbA1c próximo a 7%, e alguns apresentaram alta heterogeneidade. Ainda assim, o potencial de redução do HbA1c se mostra relevante, especialmente em grupos com diabetes menos controlado (por exemplo, HbA1c próximo a 10%).

Em termos de implicações clínicas, o uso de inibidores de PDE5 de meia-vida longa pode se tornar uma opção complementar para pacientes com diabetes tipo 2, contribuindo para o alcance de metas glicêmicas. Entretanto, recomenda-se prudência ao incorporar rotineiramente essas medicações, uma vez que não há estudos robustos com grandes amostras em populações altamente descompensadas.

Entre os pontos fortes do estudo estão a comparação direta entre dois tipos de inibidores de PDE5, a inclusão de diversos estudos controlados e a análise de subgrupos. Por outro lado, limitações incluem a heterogeneidade metodológica, o pequeno número de estudos com acompanhamento prolongado e o fato de alguns ensaios terem sido realizados em populações já com boa resposta glicêmica.

Pesquisas futuras devem ampliar a amostra de pacientes com níveis iniciais de HbA1c mais elevados, além de investigar de forma aprofundada os mecanismos farmacocinéticos que diferenciam os efeitos de meia-vida longa e curta na estabilidade glicêmica. Seria útil, também, avaliar desfechos clínicos de maior relevância (por exemplo, prevenção de complicações cardiovasculares e renais) para consolidar a utilidade desses agentes como parte de uma estratégia de manejo da diabetes.

Referência
Kim J, Zhao R, Kleinberg LR, Kim K. Effect of long and short half-life PDE5 inhibitors on HbA1c levels: a systematic review and meta-analysis. eClinicalMedicine. 2025;80:103035. DOI: http://doi.org/10.1016/j.eclinm.2024.103035

 


Meta-análise de Dose-Resposta: Pelo menos 150 minutos semanais de exercício aeróbico são necessários para redução significativa de cintura e gordura

2 Jan, 2025 | 09:30h

Este estudo surgiu diante do crescente desafio de sobrepeso e obesidade em todo o mundo, condições que acarretam riscos importantes para a saúde, como diabetes tipo 2 e doenças cardiovasculares. O objetivo foi investigar se existe uma relação dose-resposta entre a prática de exercícios aeróbicos (em diferentes durações e intensidades) e a redução de peso corporal, circunferência da cintura e gordura corporal em adultos com sobrepeso ou obesidade.

Para alcançar este objetivo, realizou-se uma meta-análise com 116 ensaios clínicos randomizados, totalizando 6880 participantes, a maioria (61%) mulheres, com idade média de 46 anos. Os estudos compararam grupos que fizeram treinamento aeróbico supervisionado, em modalidades como caminhada ou corrida, por pelo menos 8 semanas, com grupos controle sem intervenção.

Os resultados mostram que cada incremento de 30 minutos por semana de exercício aeróbico se associou a reduções graduais do peso corporal (em média 0,52 kg a menos), da circunferência da cintura (aproximadamente 0,56 cm a menos) e do percentual de gordura corporal (cerca de 0,37 ponto percentual a menos). Houve também diminuição significativa das áreas de tecido adiposo visceral e subcutâneo. Embora o treino aeróbico de qualquer duração ofereça algum benefício, os resultados apontam que a prática de pelo menos 150 minutos semanais, em intensidade moderada ou superior, foi necessária para alcançar reduções clinicamente relevantes na cintura e na gordura corporal.

Conclui-se que a prática regular de exercício aeróbico pode contribuir de maneira importante para o manejo do sobrepeso e da obesidade, reduzindo medidas antropométricas e melhorando a composição corporal. Entretanto, alcançar um volume igual ou superior a 150 minutos semanais de exercício, especialmente em intensidades moderadas a vigorosas, parece ser crucial para resultados mais expressivos.

Na prática clínica, essas descobertas reforçam as diretrizes atuais que recomendam a inclusão do exercício aeróbico como parte fundamental do tratamento da obesidade. Ressalta-se, porém, a necessidade de cautela na prescrição, observando eventuais limitações muscoesqueléticas e progressão adequada de intensidade. Entre os pontos fortes do estudo destacam-se o amplo conjunto de ensaios analisados e a avaliação dose-resposta; como limitações, a heterogeneidade dos protocolos de exercício e a possível variabilidade na aderência. Pesquisas futuras podem explorar o impacto de diferentes intensidades e modalidades de exercício ao longo de períodos mais prolongados, bem como avaliar mais detalhadamente a qualidade de vida e o uso de medicações em diversos subgrupos de pacientes.

Referência: 
Jayedi A, Soltani S, Emadi A, et al. Aerobic Exercise and Weight Loss in Adults: A Systematic Review and Dose-Response Meta-Analysis. JAMA Network Open. 2024;7(12):e2452185. DOI: http://doi.org/10.1001/jamanetworkopen.2024.52185

 


Meta-análise: Um dia de dieta com baixo resíduo tem eficácia semelhante à de múltiplos dias na limpeza intestinal para colonoscopia

26 Dez, 2024 | 15:28h

Este estudo apresenta uma meta-análise que investigou se a adoção de um dia de dieta com baixo resíduo (DBR) é tão eficaz quanto seguir vários dias desse regime na preparação para colonoscopia. O contexto parte da necessidade de limpeza intestinal adequada, fundamental para a detecção e prevenção de patologias colorretais, incluindo pólipos e adenomas. Embora diretrizes recentes apoiem o uso de DBR, ainda não há consenso claro sobre a duração ideal (1 dia ou mais de 1 dia) para otimizar a preparação e melhorar a experiência do paciente.

O objetivo principal foi comparar a eficácia de 1 dia de DBR com mais de 1 dia de DBR em termos de qualidade da limpeza intestinal e de taxas de detecção de pólipos e adenomas. Para isso, foram incluídos seis estudos clínicos randomizados, com um total de 2.469 participantes adultos que se submeteram à colonoscopia por diferentes indicações clínicas. O desenho geral envolveu a prescrição de DBR por um ou vários dias, associada a diferentes soluções de preparo (por exemplo, polietilenoglicol com ou sem ascorbato, podendo incluir outras substâncias auxiliares). A comparação entre os grupos enfatizou taxas de preparo adequado, detecção de pólipos e adenomas, e tempos de retirada do colonoscópio.

Os resultados mostraram que a taxa de limpeza adequada, avaliada principalmente pelo Boston Bowel Preparation Scale (BBPS), foi semelhante entre o grupo de 1 dia de DBR (87,2%) e o grupo de múltiplos dias (87,1%). Não se observaram diferenças estatisticamente significativas na detecção de pólipos nem na de adenomas. Além disso, o tempo de retirada do colonoscópio e a taxa de intubação cecal mostraram resultados equiparáveis entre as duas estratégias de dieta.

Em termos de conclusões, o estudo reforça que um período mais curto de DBR (apenas 1 dia) pode ser suficientemente eficaz para garantir visualização adequada do cólon, sem comprometer as taxas de detecção de lesões importantes. Assim, a adoção de 1 dia de DBR surge como uma alternativa prática e segura, podendo facilitar a adesão dos pacientes, reduzir a carga alimentar restritiva e otimizar o fluxo de procedimentos nos serviços de endoscopia.

Nas implicações para a prática clínica, ressalta-se que o menor tempo de restrição pode aumentar o conforto e a cooperação do paciente, sem queda na qualidade da limpeza. Contudo, a decisão final deve considerar condições específicas, como constipação crônica e comorbidades, além das preferências individuais.

Entre os pontos fortes do estudo, destaca-se a inclusão exclusiva de ensaios clínicos randomizados, o que reforça a confiabilidade dos achados. A heterogeneidade foi baixa ou ausente nos principais desfechos, indicando boa consistência metodológica. Como limitações, houve variação nos protocolos de DBR (inclusive quanto aos cardápios adotados) e diferenças quanto a desfechos secundários avaliados. Ademais, alguns estudos apresentaram risco de viés por seleção ou métodos de análise.

Para pesquisas futuras, sugere-se ampliar a investigação de desfechos econômicos (custos com preparo), adesão dos pacientes (satisfação, conforto) e possíveis diferenças em grupos específicos (por exemplo, pessoas idosas ou constipadas). Investigações adicionais sobre a composição exata da DBR em diferentes contextos culturais podem auxiliar na elaboração de diretrizes mais detalhadas.

Referência
Putri RD, Amalia F, Utami FA, Pamela Y, Syamsunarno MRAA. One-day low-residue diet is equally effective as the multiple-day low-residue diet in achieving adequate bowel cleansing: a meta-analysis of randomized controlled trials. Clinical Endoscopy. 2024. DOI: https://doi.org/10.5946/ce.2024.061

 


Meta-análise: Eventos adversos associados ao uso de canabinoides em adultos de meia-idade e idosos

25 Dez, 2024 | 09:35h

Este estudo teve como foco avaliar a segurança de medicamentos à base de canabinoides (CBMs) em pessoas com 50 anos ou mais, considerando tanto preparações que contêm apenas delta-9-tetraidrocanabinol (THC) quanto aquelas em combinação com canabidiol (CBD). A motivação decorre do crescimento expressivo no uso de CBMs em uma população que, por natureza, é mais suscetível a eventos adversos, especialmente quando se considera a presença de múltiplas comorbidades.

O objetivo central foi quantificar, por meio de uma meta-análise de ensaios clínicos randomizados (ECRs), a diferença na taxa de incidência (IRD) de diversos eventos adversos em adultos de 50 anos ou mais tratados com CBMs, comparados a controles (placebo ou outra intervenção). Também se buscou avaliar se há relação dose-dependente entre THC, CBD e o risco de efeitos colaterais, considerando as doses semanais das substâncias.

A metodologia envolveu revisão sistemática de bases de dados (MEDLINE, PubMed, EMBASE, CINAHL, PsychInfo, Cochrane Library e ClinicalTrials.gov), de 1º de janeiro de 1990 a 12 de junho de 2023. Foram incluídos ECRs com uso medicinal de THC isolado ou em combinação com CBD, em qualquer dose, via de administração e tempo de tratamento, desde que a média de idade dos participantes fosse ≥50 anos. Os pesquisadores extraíram dados sobre os eventos adversos (gerais, graves, retiradas, óbitos), classificando-os em diferentes categorias (ex.: gastrintestinais, neurológicos, psiquiátricos) e empregando modelos de efeitos aleatórios para combinar os resultados.

Os resultados, provenientes de 58 ECRs, mostraram que preparações contendo THC aumentaram a taxa de incidência de tontura, sonolência, alterações na mobilidade e coordenação, e sintomas de percepção/pensamento dissociativo, em comparação aos controles. Esses efeitos se mostraram relacionados à dose semanal de THC. Já as formulações contendo THC:CBD também elevaram as taxas de enjoo, vômitos, fadiga, tontura, sonolência e desorientação, ainda que algumas reações possivelmente sejam atenuadas pelo CBD. Os estudos, contudo, não demonstraram incremento significativo em eventos adversos graves ou óbitos atribuíveis ao uso de CBMs, mesmo em doses mais altas.

Conclui-se que os CBMs que contêm THC exigem maior cautela em adultos de meia-idade e idosos, sobretudo devido a efeitos adversos de natureza neurológica e psiquiátrica, cuja frequência aumenta conforme a dose. Ainda assim, em geral, não se constatou aumento de eventos graves e óbitos. Os achados reforçam que benefícios e riscos devem ser avaliados caso a caso na prática clínica, especialmente onde se consideram quedas e acidentes, já que tontura e alterações de equilíbrio podem ser mais perigosas para esse grupo.

Implicações para a Prática

  • Médicos e prescritores devem estar atentos a potenciais eventos adversos de CBMs, especialmente os ligados ao THC, e proceder a monitoramento mais próximo de pacientes com idade ≥50 anos.
  • Ajustes de dose, escalonamento gradual e associação com CBD podem minimizar algumas reações desagradáveis.
  • O perfil de segurança global não sugere aumento claro em eventos adversos graves; mesmo assim, a cautela é fundamental, dadas as possíveis interações farmacológicas em idosos polimedicados.

Pontos Fortes e Limitações

  • Ponto forte: Trata-se de meta-análise robusta que abrange uma variedade de indicações clínicas em estudos com alta heterogeneidade de participantes.
  • Limitação: Alguns ECRs apresentaram dados incompletos ou vieses metodológicos, dificultando conclusões definitivas sobre certos desfechos específicos. Além disso, a curta duração de muitos ensaios pode subestimar eventos adversos de longo prazo.

Pesquisas Futuras

  • Estudos focados em populações mais idosas (≥65 ou 70 anos) e com maior duração podem esclarecer melhor a segurança de CBMs a longo prazo.
  • Investigação de interações entre CBMs e outras classes de medicamentos usados comumente em idosos é altamente relevante para a prática clínica.

Referência
Velayudhan L, Pisani S, Dugonjic M, McGoohan K, Bhattacharyya S. Adverse events caused by cannabinoids in middle aged and older adults for all indications: a meta-analysis of incidence rate difference. Age and Ageing. 2024;53(11):afae261. DOI: http://doi.org/10.1093/ageing/afae261

 


Comparação de regimes de quimioterapia de primeira linha em câncer pancreático localmente avançado ou metastático irressecável: revisão sistemática e meta-análise em rede Bayesiana

22 Dez, 2024 | 14:39h

Contexto: O adenocarcinoma ductal de pâncreas (PDAC) permanece altamente letal, com cerca de 80% dos casos diagnosticados em estágio localmente avançado ou metastático. Desde o uso de gemcitabina isolada em 1997 como padrão de cuidado, houve aprovação de novas combinações (p. ex., FOLFIRINOX e gemcitabina mais nab-paclitaxel), mas comparações diretas entre esses esquemas ainda são escassas. Recentemente, o regime NALIRIFOX obteve resultados positivos em comparação com gemcitabina mais nab-paclitaxel. Entretanto, não há consenso claro sobre qual combinação deve ser preferida.

Objetivo: Avaliar e comparar, por meio de revisão sistemática e meta-análise em rede, a eficácia e a segurança dos principais regimes quimioterápicos de primeira linha para PDAC localmente avançado ou metastático, fornecendo uma hierarquia baseada em sobrevida livre de progressão (SLP), sobrevida global (SG) e toxicidade.

Métodos: As bases PubMed, Cochrane Central, Embase e sites de congressos oncológicos foram pesquisados até 15 de novembro de 2023. Foram incluídos ensaios clínicos randomizados de fase 2–3, publicados a partir de 2000, em pacientes sem tratamento prévio para PDAC irressecável. Os desfechos principais foram SLP e SG; dados de resposta objetiva e eventos adversos grau 3–4 também foram analisados. As análises foram conduzidas em modelo Bayesiano, comparando hazard ratios (HRs) ou odds ratios (ORs) e ordens de classificação (SUCRA). O risco de viés foi avaliado pela ferramenta RoB 2 e a qualidade da evidência pelo GRADE.

Resultados: Um total de 79 ensaios (22.168 pacientes) foi incluído. Em comparação à gemcitabina isolada, os regimes com maior benefício em SLP foram gemcitabina mais nab-paclitaxel em alternância com FOLFOX (HR 0,32), PAXG (0,35) e NALIRIFOX (0,43), seguidos por FOLFIRINOX (0,55) e gemcitabina mais nab-paclitaxel (0,62). Achados semelhantes foram observados para SG, com PAXG (HR 0,40), gemcitabina mais nab-paclitaxel alternado com FOLFOX (0,46) e NALIRIFOX (0,56) no topo da classificação. Entre os regimes triplet, NALIRIFOX apresentou perfil de menor toxicidade hematológica, enquanto FOLFIRINOX e combinações com nab-paclitaxel tiveram maior incidência de neuropatia e diarreia. A maioria dos estudos foi classificada como baixo risco ou risco de viés moderado, e a certeza geral da evidência foi considerada baixa.

Conclusões: Os resultados reforçam que triplet ou quadruplet (p. ex., NALIRIFOX ou FOLFIRINOX) podem ser opções preferenciais para pacientes que tolerem regimes mais intensivos, enquanto gemcitabina mais nab-paclitaxel permanece como alternativa importante para aqueles com pior estado geral. Estudos fase 3 adicionais, especialmente sobre regimes quádruplos ou estratégias sequenciais, são necessários.

Implicações para a Prática: A escolha do regime deve levar em conta o perfil de toxicidade, custo-benefício e características individuais do paciente. Pacientes aptos a esquemas intensivos podem se beneficiar de triplet ou quadruplet, ao passo que os demais podem receber gemcitabina mais nab-paclitaxel. O acompanhamento cuidadoso de efeitos adversos e a atenção à qualidade de vida são cruciais, dada a sobrevida ainda limitada nessa população.

Pontos Fortes e Limitações do Estudo: Pontos fortes incluem a abrangência da busca, com 79 ensaios e 22.168 pacientes, além do uso de múltiplas análises de sensibilidade. Entre as limitações estão a heterogeneidade dos estudos (fases 2 e 3, diferentes populações), ausência de dados individuais e variações nos critérios de avaliação de resposta e toxicidade. A maioria dos ensaios não realizou revisão central independente das imagens.

Pesquisas Futuras: São necessárias comparações diretas em fase 3 envolvendo NALIRIFOX, FOLFIRINOX, gemcitabina mais nab-paclitaxel e regimes quádruplos. Outras áreas de investigação incluem a identificação de biomarcadores de resposta e estratégias de quimioterapia sequencial, bem como a adoção precoce de cuidados paliativos.

Referência: Mastrantoni L, Chiaravalli M, Spring A, et al. Comparison of first-line chemotherapy regimens in unresectable locally advanced or metastatic pancreatic cancer: a systematic review and Bayesian network meta-analysis. The Lancet Oncology. 2024;25(12). DOI: http://doi.org/10.1016/S1470-2045(24)00511-4

 


Meta-Análise: Terapia Endovascular em Oclusão Vertebrobasilar Aguda Melhora os Desfechos Funcionais

19 Dez, 2024 | 19:53h

Contexto: A oclusão da artéria vertebrobasilar (OVB) está associada a altas taxas de morbidade e mortalidade. Ensaios clínicos prévios sobre terapia endovascular para OVB apresentaram resultados inconsistentes, dificultando a definição de seu papel clínico. Com a disponibilidade de novos dados de ensaios recentes, surgiu a oportunidade de avaliar a eficácia e a segurança da terapia endovascular, bem como identificar subgrupos específicos que possam se beneficiar de modo mais consistente.

Objetivo: Avaliar a eficácia e a segurança da terapia endovascular na OVB aguda, comparando-a ao tratamento médico padrão, e explorar possíveis modificadores de efeito pré-especificados, como gravidade inicial do AVC, características de imagem e etiologia do evento.

Métodos: Foi realizada uma revisão sistemática e meta-análise de dados individuais de pacientes provenientes de quatro ensaios clínicos randomizados (ATTENTION, BAOCHE, BASICS e BEST), publicados entre janeiro de 2010 e setembro de 2023. Incluíram-se pacientes com AVC isquêmico na circulação vertebrobasilar randomizados para terapia endovascular ou tratamento médico padrão. O desfecho primário foi estado funcional favorável em 90 dias (escala de Rankin modificada [mRS] 0–3), enquanto os desfechos secundários incluíram independência funcional (mRS 0–2), distribuição global da mRS (análise de shift), hemorragia intracraniana sintomática (HICs) e mortalidade em 90 dias. Ajustes estatísticos foram realizados para fatores de confusão, e análises de subgrupos investigaram heterogeneidade do efeito do tratamento.

Resultados: Foram incluídos 988 pacientes (556 no grupo endovascular e 432 no grupo controle), idade mediana de 67 anos. A terapia endovascular aumentou significativamente a proporção de pacientes com mRS 0–3 (45% vs 30%; OR ajustada [ORa] 2,41; IC95% 1,78–3,26) e mRS 0–2 (35% vs 21%; ORa 2,52; IC95% 1,82–3,48), reduziu o grau global de incapacidade (OR comum ajustada [cOR] 2,09; IC95% 1,61–2,71) e a mortalidade em 90 dias (36% vs 45%; ORa 0,60; IC95% 0,45–0,80). Apesar do maior risco de HICs (5% vs <1%; ORa 11,98; IC95% 2,82–50,81), o benefício funcional e de redução da mortalidade persistiu. A análise de subgrupos indicou benefício consistente na maioria das estratificações, exceto incerteza em pacientes com AVC de baixa gravidade (NIHSS <10). O tratamento mostrou eficácia em pacientes com e sem doença aterosclerótica intracraniana, bem como naqueles tratados dentro de 12 horas do início estimado do AVC.

Conclusões: A terapia endovascular na OVB aguda associa-se a melhora funcional significativa, redução da incapacidade global e da mortalidade, apesar do aumento no risco de HICs. O benefício foi robusto em variados perfis de pacientes, embora permaneça incerto em casos com sintomas muito leves ou grandes áreas de infarto na imagem inicial.

Implicações para a Prática: Os achados apoiam a consideração rotineira da terapia endovascular em pacientes com OVB aguda de moderada a alta gravidade. Embora exista aumento no risco de complicações hemorrágicas, o ganho global em desfecho funcional e sobrevida é substancial. A seleção criteriosa dos pacientes, particularmente quanto à gravidade inicial e extensão do infarto, é fundamental.

Pontos Fortes e Limitações do Estudo: Pontos fortes incluem a análise individual de dados de todos os principais ensaios, permitindo análise detalhada de subgrupos. Limitações envolvem possíveis vieses devido à terminação precoce de alguns estudos, exclusão de pacientes com infartos extensos ou sintomas muito leves, predominância de participantes de origem asiática (questionando a generalização) e baixa proporção de mulheres.

Pesquisas Futuras: São necessários novos ensaios para esclarecer o papel da terapia endovascular em pacientes com OVB leve, oclusão vertebral isolada, além de casos além de 24 horas do início e com grandes áreas de infarto. Pesquisas futuras também devem avaliar sua eficácia em populações mais diversas e no contexto prático do dia a dia clínico.

Referência: Nogueira RG, Jovin TG, Liu X, Hu W, Langezaal LCM, Li C, et al. Endovascular therapy for acute vertebrobasilar occlusion (VERITAS): a systematic review and individual patient data meta-analysis. DOI: http://doi.org/10.1016/S0140-6736(24)01820-8

 


Revisão sistemática | Dietas de baixo índice glicêmico/carga glicêmica têm pouco ou nenhum impacto na perda de peso em indivíduos com sobrepeso ou obesidade

30 Jun, 2023 | 12:15h

Resumo: Esta revisão sistemática examinou o impacto das dietas de índice glicêmico ou carga glicêmica (IG/CG) baixos na perda de peso em indivíduos com sobrepeso ou obesos, analisando dados de 10 ensaios clínicos randomizados com 1.210 participantes. Os desfechos analisados incluíram alterações no peso corporal, índice de massa corporal (IMC), eventos adversos, qualidade de vida relacionada à saúde e mortalidade. O estudo mostrou que dietas de baixo IG/CG provavelmente resultam em pouca ou nenhuma diferença nas mudanças de peso corporal e IMC em comparação com dietas de IG/CG mais altos ou outras dietas. As evidências sugerem uma falta de efeito em todos os principais resultados e uma possível influência positiva no humor permanece incerta.

Os estudos incluídos nesta revisão tinham uma amostra pequena com certeza moderada a muito baixa da evidência. Isso sugere que mais estudos bem estruturados com amostras maiores são necessários para conclusões mais firmes. As limitações dessa revisão incluíram o risco de viés, pois muitos dos estudos não adotaram medidas de resultado objetivas e alguns tiveram alto grau de perda de seguimento. Além disso, os pesquisadores recomendam que estudos futuros se concentrem em grupos demográficos diversos e que também incluam participantes de países de baixa e média rendas.

Artigo: Low glycaemic index or low glycaemic load diets for people with overweight or obesity – Cochrane Library

 


Revisão sistemática | Hidratação assistida em cuidados paliativos: efeitos incertos na qualidade de vida e sobrevida

27 Jun, 2023 | 12:04h

Resumo: Esta revisão da Cochrane analisou ensaios clínicos randomizados (ECR) para avaliar o impacto da hidratação medicamente assistida (HMA) na qualidade de vida (QdV) e sobrevida de adultos recebendo cuidados paliativos. Foram considerados 4 estudos envolvendo 422 participantes, todos diagnosticados com câncer avançado. Dois estudos compararam a HMA com placebo, e dois a compararam com cuidados padrão.

O desfecho primário foi QdV, avaliada por escalas validadas, sendo a sobrevida e eventos adversos os desfechos secundários. Foram calculadas as diferenças médias (DM) e as razões de risco (RR) para os resultados contínuos e dicotômicos, respectivamente. No entanto, os resultados foram inconclusivos em virtude da muito baixa certeza das evidências. Portanto, não está claro se a HMA melhora a QdV, prolonga a sobrevida ou leva a eventos adversos quando comparada ao placebo ou aos cuidados padrão.

Os achados são aplicáveis apenas a pacientes internados com câncer avançado no final da vida e não se aplicam a outros adultos em cuidados paliativos com doenças não cancerígenas, demência ou doenças neurodegenerativas. A falta de evidências de alta qualidade deixa aos clínicos a decisão com base nos benefícios e danos percebidos para as circunstâncias individuais.

Artigo: Medically assisted hydration for adults receiving palliative care – Cochrane Library

 


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