Levofloxacina para prevenir tuberculose resistente a múltiplas drogas: resultados de ensaio clínico no Vietnã
24 Dez, 2024 | 09:49hEste estudo avaliou se um regime de seis meses de levofloxacina, comparado a placebo, poderia prevenir tuberculose em contatos domiciliares de pacientes com tuberculose resistente à rifampicina ou multidroga (MDR). A motivação foi a urgência em conter a disseminação de cepas resistentes, especialmente em regiões de alta incidência como o Vietnã.
O objetivo central consistiu em verificar se o tratamento de infecção latente por Mycobacterium tuberculosis, utilizando levofloxacina, reduziria novos casos de tuberculose confirmada bacteriologicamente em até 30 meses de seguimento. Para isso, conduziu-se um ensaio duplo-cego, em que contatos domiciliares com teste tuberculínico positivo ou comorbidades específicas (como HIV) foram alocados para receber diariamente comprimidos de levofloxacina (dose ajustada por peso) ou placebo, por 180 dias.
Os participantes foram acompanhados por até 30 meses, com visitas periódicas para avaliação clínica, adesão ao tratamento e detecção de tuberculose ativa por métodos laboratoriais (cultura e testes moleculares). Entre os 2041 participantes randomizados, 1995 (97,7%) completaram 30 meses de seguimento ou tiveram desfecho primário. A incidência de tuberculose confirmada foi de 0,6% no grupo que recebeu levofloxacina, em comparação com 1,1% no grupo placebo. Isso se traduziu em uma razão de taxas de incidência de 0,55, porém sem significância estatística. Eventos adversos de grau 3 ou 4 foram pouco frequentes e similares entre os grupos, mas reações de menor gravidade (como sintomas musculoesqueléticos) foram mais comuns com levofloxacina (31,9% vs. 13,0%). Não houve aumento de resistência a fluoroquinolonas após o uso prolongado da droga.
Concluiu-se que, embora tenha havido redução numérica de casos de tuberculose com levofloxacina, o intervalo de confiança amplo impediu afirmar eficácia definitiva. Ainda assim, o regime foi bem tolerado na maior parte dos casos e não gerou resistência adquirida preocupante. Como implicação para a prática, o estudo indica o potencial de regimes à base de fluoroquinolonas para profilaxia de contatos com tuberculose resistente, mas recomenda cautela em relação à adesão e aos possíveis efeitos adversos leves.
Entre os pontos fortes, destacam-se o desenho duplo-cego, placebo-controlado, a alta taxa de seguimento (mais de 97% dos participantes) e a criteriosa exclusão de casos de tuberculose prevalente antes da randomização. As limitações incluem a incidência de tuberculose menor que a esperada, o que reduziu o poder estatístico, e o fato de os resultados se aplicarem a uma população onde a coinfecção por HIV é baixa. Pesquisas futuras poderão envolver novas estratégias de profilaxia para contextos em que haja maior prevalência de resistência às fluoroquinolonas, bem como avaliar o impacto de regimes mais curtos ou alternativas como delamanid.
Referência (Artigo Original):
Fox GJ, Nhung NV, Binh NC, et al. Levofloxacin for the Prevention of Multidrug-Resistant Tuberculosis in Vietnam. N Engl J Med. 2024;391:2304-2314. DOI: http://doi.org/10.1056/NEJMoa2314325
Editorial Relacionado:
Dorman SE. Levofloxacin Preventive Therapy for Persons Exposed to MDR Tuberculosis. N Engl J Med. 2024;391:2376-2378. DOI: http://doi.org/10.1056/NEJMe2413531